Verão de 2010
O tio Zé Alves morreu em
Dezembro de 2010. Foi um dos nossos amigos mais queridos, mais aconchegantes.
Já lá vão quatro anos e ainda consigo ouvir a sua voz ao meu lado a suspirar, com
uma desconsolação divertida: “A menina tem é de ver o Deer Hunter", filme que idolatrava.
Fomos aos Açores, era eu
ainda criança. Fizemos inúmeras caminhadas, explorando a selva de Portugal. A
sua casa era única, forrada de alcatifa felpuda em todas as superfícies, com
artefactos dispostos em prateleiras dignos de pertencer ao Louvre, e onde ao
fim de tantos anos comíamos sempre o mesmo ao jantar: bife com batatas fritas!
Todos os Verões
passávamos férias em Odeceixe. O tio Zé adorava as partidas de cartas que se faziam
à noite, onde ensinava os jogos que só ele conhecia, convocando a boa sorte ao
chamar por “Jedai!” Os passeios à Ponta Branca e as grandes jantaradas eram
essenciais. Lembro-me de dançar com o João sobre o capô do grande Mercedes,
saltando para o chão antes que o tio Zé reparasse.
Em 2007, na praia,
atravessámos o rio, fomos até às rochas e escrevemos o nosso nome em pedras que
deixámos apoiadas na falésia, para que o mar as levasse. Reparei na pedra do
tio Zé, onde escrevera “Alves 2009”. Explicou-me que era um extraterrestre do
futuro, deixando ali a sua marca. A escrita do nome em Odeceixe tornou-se desde
então num ritual de Agosto. O tio Zé partiu entretanto, mas cada Verão continuo
a ir às rochas, escolho uma pedra lisa, toda preta, e escrevo “Alves” e data,
somando dois anos àquele em que me encontro. Este Verão foi 2016. O tio Zé
sobrevive no futuro.
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